brasileiros, o povo. É construída uma imagem abrangente dos manifestantes, o que não significa que estão todos aí incluídos, como podemos observar no recorte 2 (“porção da sociedade brasileira”). A mídia mesma não se inclui na imagem de manifestantes que projeta em seu discurso: apesar de autorizá-la, permanece de fora, o que a possibilitaria intervir nos fatos.
De acordo com Mariani (1998), o discurso jornalístico “contribui na constituição do imaginário social e na cristalização da memória do passado, bem como na construção da memória do futuro”. A este respeito, observemos o seguinte recorte.
8) Na sexta-feira, o Movimento Passe Livre (MPL), que iniciou os protestos em São Paulo, anunciou sua retirada de cena. Oficialmente, declarou que tomou a decisão por jaÌ ter atingido seu objetivo. A verdade, poreÌm, eÌ que, seguindo a lei histoÌrica segundo a qual as revoluções raramente são concluiÌdas pelos que as iniciam, o MPL tornou-se irrelevante ao cabo de alguns poucos dias. Os caminhos que as manifestações tomarão, eÌ claro, estaÌ no campo da especulação. A histoÌria mostra que os grandes espasmos populares espontaÌ‚neos nem sempre prenunciam mudanças poliÌticas de mesma coloração e envergadura. O famoso Maio de 68 na França culminou com a eleição de um presidente conservador, Georges Pompidou. No mesmo fim de deÌcada, o movimento pacifista “flower power” conquistou corações e mentes de milhões, mas quem se elegeu presidente foi mesmo o direitista Richard Nixon. O certo, poreÌm, eÌ que as ruas das grandes cidades brasileiras parecem agora vacinadas contra o proselitismo, as ideologias velhas e o populismo. Essa eÌ a verdadeira revolução. (VEJA 26 de junho de 2013, reportagem principal) (grifos nossos)
Ao apresentar a “lei histórica” e como ela funciona, o discurso midiático constrói imaginariamente a verdade. Ao falar em lei é produzido por efeito uma regra. Imutável ao atrelar à lei a história: vai ser assim porque já foi assim, com “raras” exceções.
A imagem que a mídia faz da posição que ocupa é daquela responsável por “canalizar a energia pura” apontando um rumo. É produzido o lugar privilegiado que a miÌdia ocupa para falar – daquela que não soÌ mostraria a verdade, como tambeÌm de quem apontaria caminhos possiÌveis e mais prováveis (desejaÌveis?).
A verdadeira indignação não seria contra o aumento, mesmo tendo sido este o estopim das manifestações. Produzindo um efeito de verdade incontestável ao trazer “a lei histoÌrica”, o discurso midiático exclui aqueles que primeiro se manifestaram para apontar novos protagonistas (“A histoÌria mostra que os grandes espasmos populares espontaÌ‚neos nem sempre prenunciam mudanças poliÌticas de mesma coloração e envergadura”).