Emergência de sentidos: o discurso sobre as favelas no início da pandemia


resumo resumo

Tatiana Lima
Cícero Villela
Vitor Martins Ferreira



Introdução

A pandemia do novo coronavírus se apresenta como um processo importante na história recente. Atingindo todo o globo, o vírus vitimou pessoas em mais de 180 países, exigindo dos Estados, blocos políticos e econômicos e de organizações mundiais, ações conjuntas de combate e contenção da crise sanitária. Dessa forma, desde o início de 2020, pudemos assistir a uma série de medidas executadas pelos governos com o intuito de estancar os desastres sanitários da Covid-19, com destaque para o bloqueio entre fronteiras e proibição da circulação de pessoas entre países e a adoção do isolamento social e do fechamento dos comércios e atividades sociais nas cidades mais atingidas. Essas medidas, embora eficazes para frear a circulação do novo coronavírus e, vale lembrar, eram as únicas formas de prevenção até o momento, cobraram políticas econômicas que dessem conta de assegurar a estabilidade financeira das populações em meio ao desaquecimento dos mercados. Nos países economicamente desenvolvidos, estes programas de combate à pandemia surtiram um melhor efeito, ao passo que naqueles em desenvolvimento, despiu os problemas estruturais do capitalismo, bem como as fragilidades das formações sociais e históricas destes Estados.

É importante observar, como diz o geógrafo britânico David Harvey1, que a pandemia do novo coronavírus é uma pandemia de classe, de gênero e de raça, cujos efeitos perversos não se distribuíram de maneira equilibrada pelo conjunto da população conforme alardeado no começo da pandemia. Ao contrário, a maior crise sanitária do século revelou ao mundo o corpo social das desigualdades - especialmente nas economias do Sul Global, como o Brasil. O vírus chegou ao país de avião, sentado na classe executiva, mas a primeira morte ocorrida no Rio de Janeiro foi de uma trabalhadora doméstica2, contaminada por sua empregadora, que havia chegado de uma viagem à Itália. A primeira morte da pandemia foi pobre, negra e periférica e, possivelmente, a última terá este mesmo corpo como vítima - uma vez que a “política colonial do terror” (MBEMBE, 2021), isto é, “o franqueamento deliberado de um limiar da violência e de crueldade (...) se abate sobre aqueles que foram previamente privados de todo e qualquer direito” (p.42). Inclusive, daqueles que foram destituídos do direito de serem vistos, particularmente, vivos.

É a partir desta evidência social, que descortina na carne a estrutura da operação das desigualdades no Brasil, que decidimos privilegiar como recorte neste artigo a análise de matérias jornalísticas publicadas no conjunto da mídia comercial brasileira entre março e agosto de 2020 sobre a pandemia nas favelas, e que foram armazenadas na plataforma virtual do Dicionário de Favelas Marielle Franco, Wikifavelas, em sua seção “Coronavírus nas Favelas”. Esse período comporta a chegada e a primeira fase da pandemia no Brasil. Nosso propósito é analisar os discursos que articulam a situação pandêmica com as favelas e seus sujeitos. Buscamos e analisamos os discursos que possibilitam, ao mesmo tempo, enxergar como a memória se materializa nesses dizeres e como os sentidos dos acontecimentos são projetados no futuro.

No total, 101 matérias foram selecionadas para a constituição deste estudo, sendo que deste universo foram analisadas 67. Este recorte, levou-nos às seguintes perguntas: 1) na cobertura sobre a pandemia, no momento de sua emergência, quais foram os discursos sobre as favelas?; 2) Como foram produzidos esses discursos?; e 3) Qual o caráter da articulação de sentidos entre a situação de emergência de saúde com o espaço urbano da favela?

Essas questões nos mobilizaram a articular ao menos três elementos que aparecem nas matérias: a) as falas jornalísticas, aqui caracterizadas como o corpo da matéria em que não compareceu a fala de fontes; b) as fontes da favela, isto é, o aparecimento das falas de moradores e lideranças comunitárias; e c) as “autoridades em saúde pública”.

Articular tais elementos discursivamente significa deslocar a posição social empiricamente dada e olhar quais posições emergem nos dizeres. Fazer esse deslocamento ainda nos permite observar a forma como os sujeitos se materializam em seus dizeres para além da sua posição social. Uma vez que, discursivamente, a posição social é, ao mesmo tempo, constitutiva e constituída pelo discurso.

 

Em toda língua há regras de projeção que permitem ao sujeito passar da situação (empírica) para a posição (discursiva). O que significa no discurso são essas posições. E elas significam em relação ao contexto sócio-histórico e à memória (o saber discursivo, o já-dito) (ORLANDI, 1999. p.38)

 

Tal consideração nos permite analisar o jogo das relações de força que tomam a produção de sentido nos dizeres dos jornais em análise, em relação à memória discursiva (ORLANDI, 1999) que disponibiliza os dizeres sobre as favelas, fazendo com que a pandemia seja lida de determinado ângulo e de determinada forma em relação ao espaço da favela e a seus moradores.

O artigo, a partir de todo o corpus descrito acima, selecionou 24 sequências discursivas de diferentes fontes e se concentrou em duas análises. A primeira na emergência das matérias sobre o coronavírus nas favelas e a segunda buscando compreender as relações entre favela, raça e classe que se apresentaram no material

 

Breves Considerações sobre Análise de Discurso

Antes de adentrarmos na análise propriamente, é preciso fazermos uma consideração sobre o funcionamento do discurso jornalístico. Mariani (1996) vai caracterizá-lo como “discurso sobre”. Tal funcionamento pode ser descrito como “discursos que atuam na institucionalização dos sentidos, portanto, no efeito de linearidade e homogeneidade da memória” (p.64). Podemos, a partir dessa definição, dizer que o discurso jornalístico produz uma institucionalização dos sentidos, ao falar sobre determinado assunto ou acontecimento, ele busca estabilizar os sentidos desses eventos, a partir de sua narração ou descrição, mas interligados a um saber, do campo da memória, já dado na sociedade.

Esta análise tem como foco as relações de poder na sociedade e como elas se materializam nos textos. Antes de nos atermos às estratégias metodológicas que adotamos, vamos conceituar e situar o campo teórico da AD em algumas definições de conceitos básicos.

Conforme afirma Orlandi:

 

A Análise de Discurso, como seu próprio nome indica, não trata da língua, não trata da gramática, embora todas essas coisas lhe interessem. Ela trata do discurso. E a palavra discurso, etimologicamente, tem em si a ideia de curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso é assim palavra em movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando.

Na análise de discurso, procura-se compreender a língua fazendo sentido, enquanto trabalho simbólico, parte do trabalho social geral, constitutivo do homem e da sua história. (ORLANDI, 2005 p. 15)

 

Estes efeitos de sentidos são atravessados por uma miríade de discursos outros. Por isso, para se analisar um discurso não se pode ficar preso à superfície textual, é preciso referenciá-lo em um campo de exterioridade constituído pelas condições históricas dadas no momento da enunciação e pela memória discursiva, tratada como interdiscurso. Ela é

[...]o saber discursivo que torna possível todo o dizer e que retorna sob a forma de pré-construído, o já-dito que está na base do dizível, sustentando cada tomada de palavra. O interdiscurso disponibiliza dizeres que afetam o modo como o sujeito significa em uma situação discursiva dada (ORLANDI, 2005 p.31).

 

Essa memória é regionalizada por formações discursivas que estão na base do dizer e situam ideologicamente os discursos. Estas formações atuam como uma dominante, apesar das heterogeneidades que constituem todo o dizer. Por isso, toda AD não está preocupada em dizer qual o significado último dos enunciados. Ela se detém em analisar como as palavras produzem sentido. Ou seja, não o que determinada palavra significa, mas como ela significa, a partir de que posições afetadas por quais dizeres outros.

No processo de análise das matérias recorremos ao uso das chamadas famílias parafrásticas. Paráfrase em AD diz respeito ao funcionamento da linguagem, que está baseada em um princípio de tensão entre a paráfrase e polissemia.

 

Os processos parafrásticos são aqueles pelos quais em todo dizer há sempre algo que se mantém, isto é, o dizível, a memória. A paráfrase representa assim o retorno aos mesmos espaços do dizer. Produzem-se diferentes formulações do mesmo dizer sedimentado. A paráfrase está do lado da estabilização. Ao passo que na polissemia, o que temos é o deslocamento, ruptura dos processos de significação. Ela joga com o equívoco (ORLANDI, 2005. p. 36)

 

Com a separação desses enunciados de uma mesma família de paráfrases será possível percebermos o deslocamento dos sentidos e como se produzem esses enunciados sobre as favelas no período inicial da pandemia. Por este meio será possível perceber não apenas o deslocamento, mas também a estabilização dos sentidos, nos permitindo vislumbrar as formações discursivas que perpassam o texto. 

Essa separação se dá a partir da desconstrução da linearidade textual e a aproximação desses recortes a partir de recorrências, sejam temáticas, semânticas ou sintáticas. Tal procedimento nos levou às 24 sequências discursivas que colocamos em análise a partir do material em observação. Elas vão nos permitir abordar a produção discursiva sobre as favelas nos jornais, no período inicial da pandemia, como uma narrativa única e não apenas situada em um único texto.

Desta maneira será possível percebermos as ideologias manifestas nas matérias jornalísticas. Ideologia entendida não como ocultação da verdade, mas como relação necessária entre linguagem e mundo (ORLANDI, 2005. p. 47). Nessa perspectiva a Ideologia não é o que falta, mas aquilo que sobra no texto, o fechamento dos sentidos, aquele que não abre para outras possibilidades de leitura.

 

O cenário da pandemia nas favelas

Nossa observação se sustenta no fato de que a noção de discurso enquanto “efeito de sentido entre locutores” (ORLANDI, 1999. p.19), fixa-se não apenas na materialidade da língua em uso e nas relações de poder que a atravessam, mas também no fato de que todo e qualquer discurso se relaciona com outros.

 

[...] os sentidos resultam de relações: um discurso aponta para outros que o sustentam, assim como para dizeres futuros. Todo discurso é visto como um estado de um processo discursivo mais amplo, contínuo. Não há, desse modo, começo absoluto nem ponto final para o discurso. Um dizer tem relação com outros dizeres realizados, imaginados ou possíveis (ORLANDI, 1999. p.37)

 

Tal definição do funcionamento discursivo é fundamental para compreendermos a emergência de sentidos sobre a relação entre pandemia e favelas no momento de aparecimento do novo coronavírus. Como veremos, os dizeres iniciais desenham um cenário pandêmico que retoma a memória das favelas e ao mesmo tempo prevê o que poderá acontecer. Passemos à análise das sequências discursivas (doravante SD).

 

SD 1 - Mesmo antes dessa pandemia, a gente já sofria com a violência histórica da desigualdade. Ter água encanada, acesso a água diariamente e outros direitos básicos nunca foi amplamente garantido a nós. A gente poupa água não apenas por conscientização ambiental, mas por necessidade, porque a gente sabe que se tem água hoje, só terá novamente daqui uma semana", relata Raull Santiago. (UOL, 17/03/2020)

SD 2 - Como bem colocou o repórter Michel Silva, do portal Favela em Pauta, as favelas apresentam alta densidade populacional, casas muito próximas e limitações estruturais (Folha de São Paulo, 19/03/2020)

SD 3 - É um cenário de sobrevivência, [o morador] não quer saber se tem vírus se não tem. Antes mesmo do vírus matar vai ter um caos muito maior. Sem emprego, sem dinheiro, sem alimentação, a violência iria aumentar, eu me criei na comunidade e entendo porque a vila união já foi palco de tanta violência, é por causa da miséria. A falta de oportunidade, de grana, te faz fazer coisas que não quer", relatou. (G1, 27/03/2020)

SD 4 - A pobreza extrema vigia a chegada da covid-19 sem direito a isolamento social. (UOL, 29/03)

SD 5 - Favelas em tempo de coronavírus: a peste da desigualdade … o precariado brasileiro enfrenta o impasse entre a saúde e a sobrevivência. (Pública, 04/04)

 

Conforme se pode perceber, tais enunciados provêm de diferentes fontes, seja de moradores de favelas, textos de jornalistas e lideranças comunitárias. Esses dizeres se articulam pelo fato de descreverem o cenário das favelas, o que elas são na atual conjuntura e o que elas poderão ser com a chegada do vírus. Com isso, nosso interesse aqui está na articulação entre passado, presente e futuro, já que esse é o elemento que está em jogo não apenas na definição do que é a favela, mas também do que poderá acontecer em caso da chegada do vírus.

A SD1 nos apresenta esse aspecto, a fala de Raull Santiago, ativista e liderança comunitária do Complexo do Alemão, retomando um passado para descrever o presente. Nos atentemos ao trecho: “Mesmo antes dessa pandemia, a gente já sofria com a violência histórica da desigualdade”. Aqui está em jogo o trabalho da memória na descrição da favela. Ela é aquela que sofre historicamente a violência da desigualdade, ou seja, esta vem de antes da chegada do vírus.

Ou seja, se atualiza a memória da favela como a que sofre violência e, neste caso, ela se materializa na desigualdade. É preciso destacar que o sentido de violência mobilizado não é o de um evento violento, como brigas, por exemplo. Mas, uma violência que pode ser vista como estrutural das condições de vida nas favelas, a desigualdade, portanto, caracteriza a violência que provém da nossa formação social.

Esse mesmo funcionamento pode ser visto na SD5: “Favelas em tempo de coronavírus: a peste da desigualdade”. A diferença reside aqui na caracterização da desigualdade enquanto peste, deslocando e, ao mesmo tempo sustentando, o sentido de peste para o vírus e para a desigualdade.

Faz-se importante definir o que estamos chamando de memória, para uma melhor compreensão da análise. Segundo Orlandi (1999),

 

[...] ela é tratada como interdiscurso. Esse é definido como o que fala antes, em outro lugar, independentemente. Ou seja, é o que chamamos memória discursiva: o saber discursivo que torna possível todo dizer que retorna sob a forma de pré-construído, o já-dito que está na base de todo dizível, sustentando cada tomada de palavra. O interdiscurso disponibiliza dizeres que afetam o modo como o sujeito significa em uma situação discursiva dada (p.29)

 

Nas sequências em análise há todo esse trabalho da memória disponibilizando dizeres para os enunciadores no tempo presente. O que sustenta a SD1 e a SD5 é o discurso sobre a favela enquanto materialização, no corpo da cidade, da desigualdade. Esta que não chegou com o vírus, mas que é dada historicamente nas violências sofridas. Há, contudo, na SD1 uma especificação, que é a “violência da desigualdade”. Aparecendo dessa forma, ela sustenta a memória de um corte, porém, tal sentido de desigualdade é equívoco, o enunciado joga com o interlocutor, podendo ser lida ora como uma desigualdade de classe, ora como a desigualdade racial, ora como ambas articuladas. O sentido aqui não se dá todo na enunciação, é somente o leitor-interlocutor que completa esse elemento.

O segundo trecho da SD1, nos dá alguns indícios da relação entre Favela e Estado e como as favelas se marcam na cidade. Observemos o trecho: “Ter água encanada, acesso a água diariamente e outros direitos básicos nunca foi amplamente garantido a nós. A gente poupa água não apenas por conscientização ambiental, mas por necessidade”.

Há uma heterogeneidade na fala de Raull Santiago, o primeiro ponto diz respeito à relação com água. Atravessa aqui o discurso sobre a prevenção do vírus ser a lavagem constante das mãos com água e sabão. O enunciador aqui contra-argumenta que esse acesso, e outros, nunca foram garantidos aos moradores das favelas. Isto é, a fala de Santiago ao descrever a situação atual das favelas tem como interlocutor privilegiado o Estado, que é denunciado pela sua ausência em termos de políticas públicas, sendo esse elemento que o sustenta como o reprodutor da “violência histórica da desigualdade”.

A segunda parte dessa SD, “a gente poupa água (...)”, marca a divisão entre um “nós” e “eles”. Um certo discurso ambiental que fala sobre poupar água se faz presente, mas como um privilégio dos outros. Isto é, só pode poupar quem tem o privilégio de ter acesso a políticas públicas básicas de saneamento e abastecimento de água. Neste caso, “eles” (zona sul/oeste, de classe média) podem escolher poupar, enquanto o “nós”, moradores das favelas, poupam por necessidade, já que o mínimo não é garantido.

Acreditamos que esses elementos nos mostrem a memória que sustenta os dizeres sobre as favelas nos enunciados jornalísticos e dos sujeitos das favelas, pois mobiliza um imaginário social midiático sobre classe, desvelando o racismo estrutural na materialidade da cidade. Eles estão marcados pelo discurso de biopoder do Estado em forma de políticas públicas a partir do status quo da “ausência” em relação às favelas, isto é, como o espaço em que se materializa a desigualdade na cidade, que subjuga a vida ao poder da morte em forma de necropolítica. Esses elementos são a base para a projeção do futuro e para a caracterização do presente.

Essa caracterização do presente já pode ser vista na SD1, mas ganha novos contornos na SD2 e SD3. Na SD2 vemos o seguinte dizer: “as favelas apresentam alta densidade populacional, casas muito próximas e limitações estruturais”. Tal descrição se articula com as falas sobre a falta d’água. Se, neste caso, atravessava o discurso da prevenção com a lavagem de mãos, aqui o segundo aspecto das recomendações aparece. O discurso do isolamento social atravessa o texto, ao se apontar para a densidade populacional, a proximidade das casas e as limitações estruturais como forma de se mostrar a impossibilidade de tal prática nesse ambiente. Noutras palavras, os discursos discorrem sobre os determinantes sociais de saúde (DSS) presentes nas favelas: “fatores sociais, econômicos, culturais, étnico/raciais, psicológicos e comportamentais que influenciam a ocorrência de problemas de saúde e seus fatores de risco na população” (BUSS, PELLEGRINI FILHO, 2007, p. 78). Poderemos observar mais à frente que é nessa contradição entre isolar e não isolar a população, que o discurso será mobilizado de maneira mais forte. Por hora, vamos nos ater apenas a esse aparecimento descritivo.

A SD3 procura definir de fato qual é o cenário que o vírus encontra ou vai encontrar nas favelas, ele diz: “É um cenário de sobrevivência”. Esse recorte nos mostra o início da relação contraditória em relação ao isolamento social. Sobrevivência, nesse caso, aponta tanto para “estamos tentando sobreviver nesse cenário”, no sentido de que as recomendações foram acatadas e se faz um esforço para sobreviver apesar da pandemia e, o que aparece no texto, o cenário é de sobrevivência devido aos riscos que os moradores terão que enfrentar para garantir sua sobrevivência/sustento.

O segundo sentido é o que nos parece mais forte na SD3, os moradores terão que correr riscos para sobreviver, pois o isolamento social parece impossível no cenário das favelas e no contexto da desigualdade social, que obriga a todos trabalharem fora de suas casas. Temos aqui o presente das favelas sustentado pela memória da desigualdade.

SD3 ainda nos aponta para o futuro, “Antes mesmo do vírus matar vai ter um caos muito maior. Sem emprego, sem dinheiro, sem alimentação, a violência iria aumentar”. Vejamos como os elementos que apresentamos em análise se sustentam aqui e como se abrem os dizeres futuros.

O início do trecho nos mostra que o caos virá e que ele será maior que o do vírus, devido à perda da renda dos trabalhadores vai fazer com que se aumente a violência. É válido observarmos que a violência aqui não é a mesma que a indicada na SD1, na SD3, ela está mais próxima aos sentidos de violência como roubos, assaltos, ou seja, ações violentas.

Tal projeção da violência porvir só é possível pela mobilização da memória das favelas enquanto lugares “perigosos”, “violentos”, mas a forma como a questão se articula funciona mais como um alerta do que poderá acontecer, dada uma certa memória discursiva, do que uma caracterização da favela como lugar violento. Como dissemos, essa discursividade se faz presente, mas é deslocada ao ser inserida em uma previsão do que será a chegada da pandemia.

Por fim, a SD4 pode ser considerada uma síntese do que observamos até o momento. Nela se lê: “A pobreza extrema vigia a chegada da covid-19 sem direito a isolamento social”. Aqui temos os três elementos – passado, presente e futuro – articulados. “A pobreza extrema” descreve as “favelas” e, ao mesmo tempo, aponta para as desigualdades. “Sem direito a isolamento social”, descreve o presente da realidade urbana da superpopulação, das casas e becos estreitos. Além disso, “vigia” aponta para o futuro. É o uso do verbo “vigiar” que nos interessa nesse ponto.

O verbo “vigiar”, transitivo direto, possui alguns sinônimos que podem ser interessantes em nossa observação. Vigiar pode ser “velar”, “tomar conta”, "observar", “espiar” e “espreitar”, apenas para ficar em alguns deles. Tais verbos não são sinônimos perfeitos para “vigiar”, mas estão no mesmo campo semântico do verbo original. Verbos como “observar” apontam para uma atitude mais passiva do sujeito, enquanto “espreitar” e “espiar” possuem caráter mais ativo.

Contudo, o verbo atestado é “vigiar” e sua interpretação é feita exatamente na sua derivação para os outros verbos. Ou seja, dependendo da posição sujeito (ORLANDI, 1999) ele será uma atitude passiva ou ativa. Podemos dizer que há no uso desse verbo uma equivocidade, isto é, uma abertura simbólica, que possibilita diferentes leituras.

No enunciado quem vigia é a “pobreza extrema”, ela é o sujeito da oração. Tal uso reescreve “favela”, “moradores de favelas” e “desigualdade”. Porém, isso não explica o uso do verbo vigiar. Estariam os moradores das favelas, em extrema pobreza, observando passivamente a chegada do vírus? Ou estariam eles espreitando, agindo em prevenção, para quando o vírus chegar?

A resposta a tais perguntas é: as duas coisas. O uso de “vigiar” coloca em questão essas duas ações frente à pandemia, a de esperar e a de prevenir, ambas as leituras são possíveis. Na primeira, os moradores, já desgastados pela falta de direitos, pelas condições de suas casas, pela ausência do Estado, apenas esperam, é o que podemos chamar de sentidos da carência. Nessa leitura, os moradores apenas observam, sem agir. Na segunda leitura, temos o que podemos chamar de sentidos de potência, na qual os moradores, ao vigiarem a chegada do vírus, estão à espreita para prevenir e reduzir os danos. Esses dois sentidos estão na base da constituição dos dizeres sobre as favelas e a pandemia e teremos oportunidade de observá-los mais de perto na sequência de nosso trabalho.

Em síntese, podemos dizer que o início da pandemia materializa “passado”, “presente” e “futuro” das favelas a partir de um enunciado lógico do tipo: “Se p então q”. Ou seja, “se a favela é abandonada pelo Estado então teremos caos”; “se na favela as casas são aglomeradas, então, não teremos distanciamento social”; “se nas favelas não há água, então não há como prevenir o vírus”. Esses enunciados são os que mobilizam os sentidos de carência. Há outras possibilidades, conforme a análise de “vigiar” nos mostrou. “Se o Estado está ausente da favela, então nós faremos por nós mesmos”. Esses dois funcionamentos serão observados a partir de agora.

 

A favela sem poder: Considerações sobre o isolamento social

Como já foi dito anteriormente, as descrições sobre as favelas se ligam a uma memória de precariedade, seja das casas, do acesso a direitos básicos como água encanada, enfim daquilo que foi descrito como “limitações estruturais”, “violência histórica” e “cenário de sobrevivência”. É a partir desses descritores que olharemos para as próximas sequências discursivas.

 

SD6 - Sem poder parar, as favelas e comunidades pobres do País são a face mais exposta e vulnerável da pandemia. (UOL, 29/03)

SD7 - Sem poder esperar, a periferia precisou se organizar por conta própria para reduzir o impacto do vírus em suas comunidades. (UOL, 29/03)

SD8 - Mas, paradoxalmente, apesar de o presidente insistir que a economia brasileira não pode parar, sua equipe econômica parece ignorar o setor mais vulnerável da economia. (NYT, 31/03)

 

Tais dizeres aparecem já no final de março, momento em que ainda não havia nenhum tipo de auxílio do Governo Federal. O que se destaca nas sequências é a repetição “não poder x”. O uso do verbo poder em SD6 e SD7 aponta para a contradição que vimos na análise do verbo “vigiar”, isto é, abre-se tanto para os sentidos de carência quanto de potência.

Na SD6, “sem poder parar”, se articula com os sentidos de carência, a partir dos descritores das favelas como “face mais exposta e vulnerável da pandemia”, aponta-se aqui para o fato de que a realidade dos moradores das favelas os impede de parar seus serviços, sua rotina de trabalho, enfim, sua vida. Ela é atravessada pelo “cenário de sobrevivência” e pela “desigualdade histórica”, já que parar significaria não ter como se sustentar. Ou seja, a favela não pode parar, não porque não o quer, mas porque a realidade da desigualdade se impõe.

A SD7 aponta para a segunda possibilidade de leitura do “vigiar”. Em “sem poder esperar” o sentido da carência ainda se faz presente, já que a realidade continua se impondo, mas que leva a uma ação. Os moradores das favelas não podem esperar a ação do Estado para reduzir danos, não podem esperar que algo seja feito por outros. O complemento “precisou se organizar por conta própria” aponta para esse vácuo na relação com o Estado, tendo os próprios moradores que assumir o cuidado de suas comunidades para reduzir os impactos do vírus. Ou seja, potência e carência convivem na formulação em uma denúncia indireta de que não se pode esperar nada daqueles que nunca fizeram nada para as favelas.

A questão do “não poder X” aparece ainda em outra formulação, esta vinda diretamente do Estado brasileiro. Se em relação às favelas, ela aponta para o fato de que a realidade obriga os moradores a não pararem, aqui, na SD8, a fala do presidente afirma que “a economia brasileira não pode parar”. Vejamos que a economia aparece como um ente abstrato, apartada das relações de produção e dos sujeitos que produzem a riqueza. O complemento do enunciado aponta para a crítica de que o governo ignora o “setor mais vulnerável da economia”. Esse complemento reescreve a noção de desigualdade, já que, ao afirmar que há um setor mais vulnerável, coloca em evidência que há um setor menos vulnerável. Esse último trecho retorna sobre o “não parar” da economia, apontado para essa desigualdade entre quem pode e quem não pode parar.

Na revelação dentre os que podem e que não podem se prevenir aos riscos do coronavírus, o que emerge é a trama de uma história na qual se selecionam populações que serão poupadas e outras que, inevitavelmente, serão expostas à ameaça letal do vírus. “Para evitar serem mortos, basta que não sejam quem são. Ou então, só pode ser de modo fortuito, como danos colaterais. Para evitar serem mortos, basta que não estejam no lugar em que estão naquele exato momento”. (MBEMBE, 2020, p. 142)

Noutras palavras, diz respeito àquelas que poderão ser mortas em detrimento da saúde econômica do país. Este processo ocorre tendo como elemento seletor a desigualdade histórica. É a ela que se recorre para estabelecer quem tem direito ou não de “parar” - leia-se proteger-se, resguardar-se, viver etc. Neste sentido, os discursos não apresentam as vítimas - ou potenciais vítimas - da pandemia de forma natural, mas sim no contexto de gestão das mortes (MBEMBE, 2018).

Podemos aproximar os trechos “face mais exposta e vulnerável da pandemia” (SD6) e “setor mais vulnerável da economia” (SD8). Ambos se sustentam nos sentidos da carência, já que falam sobre a vulnerabilidade e, ao mesmo tempo, abrem para o que se tornará o debate entre “economia” e “saúde”. No primeiro, a vulnerabilidade recai na relação da exposição ao vírus, a partir da memória do espaço da favela, fazendo com que seus moradores sejam os “mais vulneráveis da pandemia”, aqui a desigualdade se manifesta em relação à saúde.

No segundo, eles são os vulneráveis da economia, ou seja, aqueles mais pressionados a saírem em busca do seu ganha-pão e que estão sendo desconsiderados pelo governo, é a desigualdade econômica aparecendo. Podemos dizer, que tais sentidos articulam vulnerabilidade e desigualdade, apontando para diferentes questões, mas sustentando que existem sujeitos que estão mais ou menos vulneráveis aos problemas, de saúde e econômicos, que a pandemia impõe.

 

SD9 - "Vimos muitas pessoas falando assim, quando dizíamos que não podiam ficar na rua: 'Que não pode ficar na rua, o quê? O presidente falou que pode", assinalou Macarrão. (G1 27/03/2020)

SD10 - Os esquecidos … A favela é um ambiente inóspito, é impossível guardar a quarentena nos moldes estipulados pelo Ministério da Saúde. (UOL, 06/04)

SD11 - Nísia Trindade Lima, presidente da Fiocruz, uma das instituições brasileiras de referência em pesquisa na área da saúde pública, explicou em uma entrevista recente que a Covid-19 “chega de classe executiva, mas se depara com uma realidade em que nós temos uma alta densidade populacional e em condições habitacionais de muitas vulnerabilidades, como é o caso de muitas das nossas periferias e favelas em todos os centros urbanos do Brasil. Além disso, temos uma mobilidade urbana difícil, com transportes lotados”. (El País, 05/04)

SD12 - “A gente sente muito medo, porque a pandemia está cada vez mais perto, principalmente depois da confirmação de um óbito aqui na Maré”, diz Pamela Carvalho, moradora, há 27 anos, da favela Parque União, do conjunto de comunidades da Maré. (…)  “São desafios que foram apenas escancarados com a Covid-19, mas que a gente encara desde sempre, enquanto morador de favela. As favelas são lugares onde os direitos não são garantidos pelo poder público”, ressalta. (CB, 13/04)

SD13 - Ignorada por pesquisadores, pela população e também pelos governos, a favela continua a ser vista majoritariamente a partir dos perigos que supostamente oferece. Se antes era território de criminalidade, hoje, em meio à pandemia, ela é o lugar onde a doença pode se alastrar de forma descontrolada. (O São Gonçalo, 05/05)

SD14 - "Nós estamos em um momento que uma parte da sociedade tem acesso a tudo, a home office, álcool em gel, máscara... E uma outra parte, que é a parte da favela, não tem sequer acesso a água (UOL, 18/07)

 

As sequências discursivas acima vão nos servir para aprofundar a análise dos sentidos das vulnerabilidades que se impõem no ambiente das favelas. É válido lembrar, que essa vulnerabilidade, até o momento, nos apontou para dois sentidos, o da carência, funcionando como a denúncia do abandono do poder público com as comunidades e o da potência, que a partir da constatação desse abandono se transforma em ação dos moradores no controle do vírus.

Vamos aproximar, em um primeiro gesto, as SDs 11, 12 e 13. Nelas são apresentadas o caráter das carências com a qual as favelas têm de lidar. Em 11 lemos: “uma realidade em que nós temos uma alta densidade populacional e em condições habitacionais de muitas vulnerabilidades”. Este dizer repete o que já foi analisado em nosso primeiro bloco de análise, isto é, a leitura das favelas a partir dos déficits habitacionais, densidade populacional, que impediriam um isolamento social de fato.

A SD12 produz um pequeno deslocamento, o relato da moradora da favela da Maré retoma as noções de abandono, denunciando-o e mostrando que a pandemia não trouxe novidades, apenas trouxe à tona questões que já existiam no cotidiano dos moradores. No trecho, “As favelas são lugares onde os direitos não são garantidos pelo poder público”, as “vulnerabilidades” são definidas, estas não surgem por acaso, elas são efeito da falta de garantia de direitos pelo poder público. Essa sequência está a meio caminho entre a carência e a potência, aqui a carência é usada para descrever e, ao mesmo tempo, para denunciar o abandono.

Porém, é na SD13 que aparece com mais contundência esse batimento entre descrição e denúncia que estamos observando. Vejamos: “a favela continua a ser vista majoritariamente a partir dos perigos que supostamente oferece. Se antes era território de criminalidade, hoje, em meio à pandemia, ela é o lugar onde a doença pode se alastrar de forma descontrolada”.

O primeiro elemento de destaque é o verbo “continuar”, ele carrega consigo o pressuposto de que havia algo antes, nesse caso o antes é o imaginário das favelas a partir dos perigos. Importante notar, que aqui o elemento do perigo aparece, tais perigos que são retomados no próprio enunciado por “território de criminalidade”, aqui mobilizando a memória discursiva da guerra (VILLELA, 2015; LIMA, 2015).

Os sentidos do perigo ganham, todavia, uma nova coloração com a pandemia, já que a “doença pode se alastrar de forma descontrolada”, apesar do verbo “poder” modalizar a enunciação, isto é, pode ocorrer ou não, ela se sustenta ainda na memória dos perigos das favelas, que se outrora se articulava com o crime, agora se articula com a Covid-19. Porém, há aqui o deslize dos sentidos para o descontrole e, ao nosso ver, ele é o elemento que articula essa passagem de um “perigo” ao outro.

Descontrole, materializada em “forma descontrolada”, toma como escopo a pandemia no recorte, mas se olharmos como um todo podemos aproximá-lo também dos dizeres sobre “falta de estrutura”, “abandono do poder público”, “cenário de sobrevivência”, para ficarmos apenas em alguns exemplos. Façamos essa comparação, “descontrole” se articula com as moradias a partir de enunciados como “crescimento desordenado das favelas”. Este dizer não se atesta em nosso material, mas possui a memória dos processos de “favelização”, em que se diz que as casas se multiplicam de forma desordenada normalmente. A desordem, portanto, é parte constitutiva dos discursos sobre as favelas e isso nos leva à noção de “abandono do poder público” - lê-se aqui um abandono gestado como margem pelo próprio Estado (VEENA DAS & POOLE, 2008) -, pois elas crescem dessa forma por uma suposta falta de “planejamento urbano” que, por sua vez, cria um “cenário de sobrevivência” para os moradores. Desordem, com isso, articula em torno de si os elementos que estamos observando nesse quadro analítico. É esse enunciado de suposta desordem que abre um novo perigo, de que o vírus se espalhe desordenadamente, a partir das favelas. Nesse sentido, nas favelas, o vírus não cria desordem, ele apenas se insere em um aspecto já dado nos discursos sobre o território urbano, servindo apenas para estigmatizar ainda mais tais populações que sobrevivem e habitam o espaço como podem, que foram deixados à margem pelo Estado.

Tais considerações nos levam à SD10, quando afirma: “Os esquecidos… A favela é um ambiente inóspito”. “Esquecidos” carrega uma ambiguidade fundamental, ele pode ser lido como substantivo, como aparece atestado, no qual existem sujeitos que foram ou são esquecidos. Ou como particípio passado do verbo “esquecer” atestado na forma composta “ser esquecido”.

Vamos construir duas frases para olharmos mais pormenorizadamente essa questão. Vejamos a construção: “Os esquecidos foram nas favelas” ou “Os esquecidos são das favelas”. Esses enunciados apontam apenas para o fato de que há sujeitos que esquecem, eles não são esquecidos por alguém, mas são constituídos pelo seu esquecimento, daí serem pessoas “esquecidas”. Esses elementos ainda não resolvem nossos problemas. Precisamos nos perguntar, afinal, quem são os esquecidos? Ou o que eles esquecem?

Se alterarmos a ordem da frase e colocarmos “os esquecidos” na posição de predicativo do sujeito teremos: “Os moradores das favelas são esquecidos” e “Os moradores das favelas foram esquecidos”. Na primeira, com o verbo “ser” no presente temos uma qualificação para os moradores das favelas, o fato de serem esquecidos. Ser esquecido nesse caso aparece como uma condição daquele que se esquece, que possui falta de memória, esse é um dos aspectos de “esquecidos”. No segundo caso, com o verbo ser no passado, os moradores passam a ser objeto de um esquecimento e não o sujeito dele, mas, ao mesmo tempo, se sustenta a ambiguidade já que construções como “eles foram esquecidos, mas não são mais”, por exemplo, mantém esse jogo entre ser sujeito ou objeto de um esquecimento.

Ressaltar essa ambiguidade é importante, pois ela está em pleno funcionamento ao se designar tais sujeitos como “os esquecidos”. A SD10 nos dá uma pista do caráter desses “esquecidos”. Ao afirmar que a “a favela é um lugar inóspito” podemos dizer que os “esquecidos” são os habitantes desse lugar. Segundo o Dicionário Houaiss da língua portuguesa, inóspito é “Característica de local onde não se pode nem se consegue viver; sem condições de habitabilidade; inabitável: terreno inóspito, clima inóspito”. Descrever, portanto, a favela como lugar inóspito atualiza a memória da carência que estamos observando e, ao mesmo tempo, qualifica os moradores como habitantes esquecidos nesse lugar.

Tal classificação constitui parte do enquadramento que o discurso busca emitir em relação às favelas - enquadramento aqui compreendido como aquilo que “busca conter, transmitir e determinar o que é visto” (BUTLER, p. 25). Ou seja, é a partir de uma moldura que define as favelas como espaço onde a vida não pode existir que são projetados os sentidos que elaboram e narram o contexto da pandemia nesses locais. Sendo assim, o que se apresenta é o não reconhecimento da vida dos favelados enquanto uma vida possível. Apesar disso, o lugar inóspito do qual a SD10 aborda mantém figuras vivas, seus moradores. Isto indica a ideia de que se apreende algo sobre o local onde estas figuras estão situadas mesmo que elas não estejam sendo reconhecidas como vidas. Nos interessa aqui destacar que o apreendido se entende “como um modo de conhecer que ainda não é reconhecimento” (BUTLER, p. 20). O deslocamento de uma vida para uma figura viva aparece no modo como o discurso cria formas cognoscíveis de reconhecer o que é - leia-se o que deve ser - a vida no contexto urbano. Estas formas podem ser traduzidas justamente na oposição da inospitalidade que é utilizada para descrever as favelas.

Por fim, podemos dizer que designar os moradores como “esquecidos” aponta para a ambiguidade. Se o aproximarmos dos dizeres sobre a impossibilidade de distanciamento social, diremos que os moradores se esquecem de cumprir as determinações da OMS. Ao mesmo tempo, se aproximarmos dos enunciados que falam do abandono do Estado, que faz com que tais pessoas vivam em condições inóspitas, diremos que os moradores são o objeto de esquecimento do Estado e por isso são comunidades “esquecidas pelo Estado”. Isso nos leva para a SD14 que aponta para uma divisão entre “esquecidos” e “não esquecidos”, ao apontar que uma parte da sociedade tem direito ao distanciamento e outra parte que não tem sequer acesso à água.

Além disso, a SD10 traz um novo elemento que será chave para a compreensão de análises futuras. “Vimos muitas pessoas falando assim, quando dizíamos que não podiam ficar na rua: 'Que não pode ficar na rua, o quê? O presidente falou que pode”. É preciso lembrar que o governo federal, nesse momento, pregava o lema “a economia não pode parar” e o presidente sustentava a não necessidade do isolamento social. A voz da autoridade do presidente aqui trabalha contra a organização das favelas para lidar com a pandemia, isto é, um biopoder da vida sobre o qual o poder estabelece o controle do estatuto político dos corpos, expressando uma soberania como um direito de matar (MBEMBE, 2018).

Após esse percurso de análise, podemos então caracterizar o que, até o momento, chamamos de sentidos de carência como uma Formação Discursiva. “A formação discursiva se define como aquilo que numa formação ideológica dada – ou seja, a partir de uma posição dada em uma conjuntura histórica dada – determina o que pode e deve ser dito” (ORLANDI, 1999. p.41)

Ou seja, podemos falar de uma formação discursiva da carência que disponibiliza os dizeres das favelas como lugares inóspitos, abandonados, esquecidos e seus moradores como sobreviventes e que vivem em situações precárias. Essa formação possibilita, a emergência da crise sanitária descrever as favelas da forma que estamos observando. Ao mesmo tempo, é ela que vai possibilitar, ao se articular com gestos de denúncia em relação ao abandono do Estado, o deslocamento para a leitura das ações de potência dos moradores na lida com a pandemia.

 

Favela, Raça e Classe

Até o momento pudemos descrever o que chamamos de formação discursiva da carência. Esta disponibiliza os dizeres sobre a favela como lugar inóspito, vulnerável, onde as condições de vida humana são precárias. Dentro desse paradigma, os moradores são descritos como carentes. Mas isto nos leva a seguinte pergunta: carência de quê?

A carência, contudo, se articula com os gestos de denúncia dos moradores das condições que vivem - condições essas dadas e gestadas pelo Estado. Tal denúncia aponta para o abandono do Estado, seja em questão do abandono à própria sorte, a falta de políticas de saneamento básico e como os esquecidos pelo poder público: uma gestão da pobreza que na realidade trata-se de fabricação da condição da pobreza, majoritariamente negra, evidenciando a necropolítica. Essa articulação será olhada mais à frente em nosso trabalho. Nos dedicaremos agora a aprofundar as especificidades da formação discursiva da carência e como ela vai se especificando na descrição da situação pandêmica nas favelas.

SD15 - "Para mim, a quarentena acabou. Tu ver tantas pessoas passando necessidade... como é que eu vou ficar em casa isolado sendo que meus amigos e famílias estão passando perrengue?" (G1 27/03/2020)

SD16 - Moradores da comunidade foram dispensados dos serviços e não conseguem mais fazer 'bicos' … Por ali, a fome já chegou. Devido a pandemia do coronavírus, a jovem não consegue mais os "bicos" que fazia, dentro da comunidade e em bairros da Zona Sul, para completar os R$ 200 que recebe do Bolsa Família. (Época, 02/04)

SD17 - “a fome mata mais que o vírus”. … “À intranquilidade pela falta de saneamento básico — “desprezado pelos políticos porque não aparece nas campanhas eleitorais”, diz o líder dos moradores de Paraisópolis— soma-se uma preocupação ainda mais urgente, o desastre econômico: os comerciantes perderam sua renda com o fechamento das lojas, e muitos porteiros ou babás que trabalhavam nos bairros de classe média alta “foram despedidos ou colocados em férias não remuneradas”. (El País, 05/04)

SD18 - Se eu parar, não tenho mais trabalho. Moço, aqui é tudo amontoado. Nós estamos abandonados e esquecidos. (...) diz Julio da Silva Lima, da Jacaré Moda, que leva jovens da favela para as passarelas. .... "É preciso ver quem são as pessoas que estão passando mais necessidade. Os ambulantes e os camelôs perderam a fonte de renda. Hoje, não temos nenhum órgão do governo para nos ajudar", desabafa o líder comunitário. (UOL, 06/04)

SD19 - Os desafios da periferia: ou morrer de fome ou de covid-19 (Terra, 09/04)

SD20 - Nas favelas, até a pandemia de coronavírus é invisível … Dados levantados pela ONG Redes da Maré apontam que a covid-19 já pode ter matado ao menos 35 pessoas no Complexo da Maré. Porém, apenas oito óbitos foram contabilizados oficialmente … A previsão de que a mortalidade poderá ser maior nesses territórios é fundamentada em fatores da desigualdade socioeconômica: a intensa circulação de moradores que não podem parar de trabalhar; a proximidade e o tamanho dos domicílios, becos e travessas contribuindo para o contato entre as pessoas; a dificuldade de acesso aos recursos para prevenção ou tratamento da doença, entre outros. (El País, 14/05)

 

As sequências discursivas acima descrevem a situação de carência trazendo um novo elemento, a condição de classe. Quando falamos em situação de classe buscamos aproximar as questões relativas à situação econômico-social que se colocou nesse período da pandemia. Elas servem para descrever a situação de carência e especificar quem são os sujeitos afetados economicamente pela pandemia.

Iniciamos nossa análise com a SD15, onde se lê na fala de um morador: “Para mim, a quarentena acabou. Tu ver tantas pessoas passando necessidade”. O dizer peremptório do fim da quarentena nos aponta para elementos que já pudemos ver anteriormente, a da impossibilidade de se guardar quarentena nas favelas. Porém, aqui há um novo elemento, se em nossas análises anteriores, essa afirmação era sustentada pelos problemas estruturais de moradias e de higiene, aqui ela se ancora em um elemento de solidariedade, basta olharmos para o completo da fala: “como é que eu vou ficar em casa isolado sendo que meus amigos e famílias estão passando perrengue?”.

O que motiva a afirmação do fim da quarentena, por parte do morador, não é a falta de acesso a determinadas estruturas, mas a realidade de “perrengues” e “sobrevivências” da família e amigos. Aqui se repete o movimento que descrevemos, a fala denuncia as condições, aponta para um vácuo institucional e faz com que o morador, em meio a tal abandono, precise buscar ganhar seu dinheiro. Não se trata de uma escolha pelo fim da quarentena, se trata das condições materiais de vida nas favelas que impele os sujeitos a escolher, como diz a SD19, entre “morrer de fome ou de covid-19”.

Essa SD sintetiza o aparecimento da noção de classe, nesse contexto, a escolha que está sendo dada é essa. Basta olharmos como a SD19, retoma e sintetiza as SDs, 16, 17 e 18. Em todas elas o elemento “fome” se faz presente de alguma forma, seja dito diretamente se articulando com o desemprego, seja com a afirmação de “não poder parar”. Esses aparecimentos dão mais substância ao que estamos observando na “FD da Carência”. Elas apontam também para o abandono do Estado, nos levando, novamente, ao tema dos “esquecidos”.

Tais afirmações se articulam com as noções de Necropolítica (MBEMBE, 2018), na qual o poder soberano – e aproximando essa noção com o Estado – possui o poder de vida e morte. Nesse caso pandêmico, não estamos falando da morte direta por algum agente do Estado, mas de uma morte feita por meio do abandono à própria sorte. Os sujeitos moradores de favelas estão nessa ordem de corpos “morríveis”, de “abandonados” e “esquecidos”, como diz a SD18. Enquanto o Estado assume o papel que pode ser resumido no paradigma biopolítico de fazer morrer e deixar morrer (FOUCAULT, 2010).

Tal olhar, nesse segmento, recai sobre as questões de classe. Os abandonados são os pobres que vivem amontoados, como mostra a SD20, que possuem uma vida precária e que vivem no local onde o vírus compartilha a condição de invisibilidade. O que se desdobra aqui na definição desses sujeitos é sua condição de carência, agora descrita como da ordem da desigualdade socioeconômica e racismo estrutural. A entrada desse elemento não desloca a Formação Discursiva, ela a específica e descreve a situação das favelas dentro desse mesmo enquadramento.

Todavia, a questão da classe, apesar de aparecer com mais força, vai se articular também com discursos racializados.

 

SD21 - As chances de um paciente preto ou pardo e analfabeto morrer em decorrência do novo coronavírus no Brasil são 3,8 vezes maiores do que de um paciente branco e com nível superior, apontou uma análise de quase 30 mil casos de internações pela Covid-19 feita pelo Núcleo de Operações e Inteligência em Saúde da PUC-Rio, destacando o impacto das desigualdades sociais na letalidade da doença no país. (Reuters, 27/05)

SD22 - A população negra, por sua vez, tem sido afetada por compor a maioria dos trabalhadores informais, que são os primeiros a serem demitidos em momentos de crise. (G1, 30/05)

 

As especificações sobre quem são os carentes não se reduzem à questão da classe social. Ela também se desdobra nos discursos sobre as noções de raça. Esses elementos podem ser observados nas sequências acima. Na SD21, ela é apontada nos dados para o risco de morte, a partir de dados de uma pesquisa da PUC-Rio. Aqui a população negra aparece como um subconjunto dentro das desigualdades sociais, reescrevendo a noção de carente num discurso sobre o risco de morte.

Na SD22, raça e classe aparecem relacionadas, a partir da oração explicativa, “por compor a maioria dos trabalhadores informais” que, reescrevem na explicação “a população negra”, que aparece como sujeito da oração. As noções de risco e raça estão ligadas à FD da carência que estamos descrevendo, já que funciona na memória discursiva a favela como o lugar do pobre urbano e, no caso do Brasil, do pobre urbano negro. Tais pontos não são sem consequências, já que mobilizar a questão racial traz à tona não apenas a desigualdade econômica, mas também a racial – o comparativo com os brancos da pesquisa na SD21 nos mostra esse aspecto.

O aparecimento da especificação negro-pobre em nosso corpus não é sem consequências, ela é possível pela conjuntura política atual. As lutas por reconhecimento e os processos de dar visibilidade aos negros e ao racismo em nossa sociedade, pode ser especulado como um motivo para os jornais especificarem os riscos para a população negra. Modesto (2021) vai apontar uma tendência das mídias em geral de silenciar sobre a questão racial, em especial quando se trata da violência do Estado contra as populações periféricas. Ele vai dizer, ao analisar os discursos sobre a morte de homens negros que, a cobertura jornalística que desracializa os discursos. Em nosso caso, podemos dizer que há um meio de caminho, há racialização dos riscos, mas, ao mesmo tempo, tal racialização aparece como uma especificação das desigualdades de classe.

 

SD23 - Corte de água, fake news, falta de álcool em gel, alimentos e de consciência de classe colocam moradores das quebradas em risco (Terra, 09/04)

SD24 - A fome, a falta de renda e a desinformação têm contribuído decisivamente para o descumprimento de medidas adotadas para conter o coronavírus em áreas carentes das maiores cidades do país, de acordo com uma enquete feita com líderes comunitários de seis regiões metropolitanas. (FSP, 24/05)

 

O que estamos tentando dizer até aqui reside no fato de que as descrições das favelas são ideologicamente atravessadas e constituídas pela Formação Discursiva da carência. Mesmo em descrições que se dizem “objetivas” da realidade desse espaço urbano, há o atravessamento de julgamentos calcados na noção de carência.

Essas duas últimas sequências discursivas nos permitem ver como uma descrição do ambiente social das favelas, desliza para um julgamento moral sobre o comportamento de seus moradores. Na SD23, o que falta aos moradores é “consciência de classe”, além das ausências, já apontadas, do Estado. Ou seja, se não há quarentena nas favelas a culpa é dos moradores que não possuem consciência de classe em relação aos seus pares.

Um bom comparativo para esse julgamento é a SD15, onde podemos aventar que o morador não está em quarentena exatamente por possuir consciência de classe. Isso se entendermos por consciência de classe uma certa forma de solidariedade, como faz parecer a SD23.

O comparativo nos permite ver o deslizamento interno da FD da carência. Na primeira a carência desliza para uma ação, ainda que individual, do morador que não suporta mais ver o “perrengue”. A segunda desliza para o julgamento dos moradores das favelas, fazendo com que a carência seja a base de todos os problemas, fazendo com que se culpe os moradores pelos problemas instalados com a pandemia. A SD24 ameniza a crítica, deslocando a falta de consciência de classe para “desinformação”, mas ainda assim exercendo um julgamento sobre os sujeitos moradores.

 

Considerações Finais

Os discursos mobilizados pelos veículos de mídia comercial para retratar o coronavírus nas favelas não se constituiu como fato em si. Ao contrário, estiveram atrelados a uma memória discursiva relacionada às favelas que teve como efeito orientar o dizível - isto é, o que pode ser dito - sobre estes espaços em contexto de pandemia, como demonstramos na primeira seção deste trabalho. Esta memória nos leva a evidenciar sua formação discursiva; a carência, revelada pela presença da desigualdade social. É a partir do espectro da carência que foram permitidos a esses veículos significar ‘lugares inóspitos’ e as populações desses lugares como fontes potencialmente perigosas para a contenção da pandemia, se pensarmos a crise sanitária em termos de saúde pública.

Neste mesmo sentido, fora esta formação discursiva que abriu caminhos para o debate em torno da impossibilidade de se garantir - sob uma perspectiva econômica - a segurança da população como um todo, sob o prisma da desigualdade social. Relacionada em intersecções entre classe e raça, esta desigualdade garante ao discurso uma única saída possível: a decisão, já conferida, quanto a quem viverá e a quem estará exposto à morte numa conjuntura que relaciona um vírus letal a uma estrutura social conflitante e desigual.

Evidentemente, este artigo não possui o interesse de desvendar a totalidade dos recursos discursivos das mídias comerciais, como também não pretende apresentar a relação favelas e Covid-19 de forma unívoca. Sabe-se que a pandemia continua a gerar impactos na sociedade e que as narrativas empreendidas para descrever o momento ainda estão sendo disputadas. Entretanto, acreditamos que este estudo ajuda a compreender como se deu o processo de enquadramento do tema por esses veículos - mesmo que com os recortes realizados. Vale lembrar que tais molduras não são apenas um modo de emitir opiniões sobre um fato, mas constituem formas com as quais populações atribuirão sentido a algo relativo à vida coletiva.

 

Não podemos reconhecer facilmente a vida fora dos enquadramentos nos quais ela é apresentada, e esses enquadramentos não apenas estruturam a maneira pela qual passamos a conhecer e a identificar a vida, mas constituem condições que dão suporte para essa mesma vida. (BUTLER, p. 44).

 

São esses motivos que tornam importante compreender analiticamente os discursos em torno dessa temática, considerando tamanha proporção da Covid-19 e seus desdobramentos na atualidade bem como seus cruzamentos com os problemas sociais, econômicos e históricos que formam a sociedade brasileira.

 

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Data de Recebimento: 13/02/2023
Data de Aprovação: 05/04/2023


1  Disponível em <https://blogdaboitempo.com.br/2020/03/24/david-harvey-politica-anticapitalista-em-tempos-de-coronavirus/>. Acesso em 05/11/2021.

2 Disponível em < https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2020/09/17/seis-meses-apos-domestica-ser-a-1a-a-morrer-de-covid-no-rj-outras-profissionais-relatam-desafios-na-pandemia.ghtml>. Acesso em 05/11/2021.